terça-feira, 26 de julho de 2016

Sobre descobrir que esforço é diferente de sofrimento


     Há um tempinho, num dia de meio da semana e finzinho de semestre, eu deitei na minha cama e dormi por 9 horas seguidas sem colocar o celular pra despertar ou deixar o blecaute aberto para o sol me acordar. Talvez isso seja um acontecimento até curioso pra quem conhece meu jeito agoniado, mas com certeza não deveria ser um fato que me gerasse tanta reflexão. Antes desse dia, eu tinha passado quase duas semanas sem conseguir dormir mais de 3 horas por noite. Não tinha final de semana, viagem ou doença que me fizesse parar um pouco, eu até estava ciente de que meu cansaço, na realidade, me fazia mais improdutiva, mas era meu corpo que involuntariamente não conseguia descansar, de um jeito tal que às cinco e meia de manhã eu acordava assustada e sentindo a consciência pesada, mesmo sabendo que eu só tinha ido pra cama porque às três da manhã eu estava desabada e babando em cima do computador.

     Eu não sei qual porcentagem de culpa eu devo colocar nos fatores para a situação ter se descarrilhado assim, se seria 40% disso devido à minha desorganização e talento excepcional para a arte da procrastinação, uns 20% devido à minha propensão em me sobrecarregar, outros 20% ao meu perfeccionismo, talvez 10% ao meu computador que não falha em me desapontar e 10% aos problemas de comunicação com professores e outros... O fato é que, por mais que eu tente racionalizar, não sei dizer o que gera pra mim esses momentos em que minha vida gira ao redor de alguns desenhos e apresentações de PowerPoint em um computador, mas o que eu sei é: o que faz com que eu não consiga sair desse ciclo, independentemente do cansaço extremo, é o meu gigantesco e intimidante medo de falhar e desapontar. E ele vem vestindo a roupa do temor por um futuro no qual eu não "venço" e no qual eu fico revendo na memória esses dias pensando "Por que diabos eu não virei algumas noites?", e isso torna as coisas levemente piores.

     E aí vem a nossa tia falar daquele primo que desde muito cedo nunca gostou muito de sair, passava as noites estudando, não tinha muito assunto com ninguém, e hoje está fazendo doutorado na Alemanha ou tomando banho na sua piscina de dinheiro particular. E eu também já cansei de ver esfregada na minha cara a história da blogueira - só um mês mais nova que eu, diga-se de passagem -  que poderia ser como qualquer outra garota, mas, diferentemente de qualquer outra garota, tem um império virtual, duas casas próprias, sei lá quantos livros publicados, aposentadoria vitalícia garantida pros pais que tanto batalharam para criá-la, e etecetera etecetera e esses tipos de histórias sempre nos fazem pensar o bom e velho "Por que não eu?", mas não fazem a gente encarar a verdade do tanto de abnegação envolvidas nesses ditos sucessos.

     E muito fácil ouvir histórias que falam de sucesso calculando somente a quantidade de esforço e suor, mas sem entender a quantidade de sorte e de danos envolvidos. Esse texto não é sobre sorte, mas nesse assunto, temos que admitir duas coisas: 1 - trabalho duro sem uma pitada de "acaso" dificilmente cria esses casos extraordinários que enchem nossos olhos, e 2 - temos que entender que só porque reconhecemos que fulano teve sorte com alguma coisa, ninguém tá falando que fulano não trabalhou duro pra cara*** também. 

     Depois desse simplificado comentário sobre sorte, eu queria falar sobre a coisa que realmente me bateu nesse último mês: danos. Eu nunca vou ser capaz de entrar na cabeça da blogueira e entender exatamente o que ela sente quando diz que perdeu aquela que poderia ter sido a melhor época da vida dela pra chegar onde chegou hoje, pode ser que tenha valido a pena ou pode ser que não, mas independentemente, é exatamente essa parte da história que a gente nem sempre ouve e por isso vivemos tentando basear a "quantia" de sucesso que nos é esperada comparando com a dos outros que tem a mesma idade que a nossa, ou que vieram de mesma situação financeira que a nossa ou quaisquer outros parâmetros do tipo, quando a única experiência sobre a qual eu posso falar é a minha própria. E, sendo assim, minha única conclusão para o estilo de vida e de pensamento que tenho tido é: não tem valido a pena e, pasmem, se continuar assim, não vai valer a pena daqui a um ano ou mesmo daqui a uma década.

     E se há uma coisa certa nesse mundo é que não adianta falar pra mim sobre seu colega que "também passou por isso, também abdicou do sono e da vida social para hoje se tornar um arquiteto bem sucedido, porque arquitetura é assim mesmo..." quando a questão, na verdade, é que a LUANA aqui não é assim mesmo... A questão é que a Luana, desde 2012, esteve à beira de um ataque de nervos pelo menos umas 6 vezes... A questão é que: cada pessoa é dotada de limites - físicos, emocionais e mentais - que são completamente PESSOAIS, e muitas vezes queremos forçá-los em nome da obtenção de uma ideia de sucesso que é extremamente UNIVERSAL, e pra que isso aconteça, a gente romantiza atitudes auto destrutivas, por exemplo competindo pra saber quem passou mais noites sem dormir ou quem se valeu das misturas mais mirabolantes de bebidas e remédios que dão "energia". Quanto mais "véi, passei o final de semana estudando, não parei um segundo", mais orgasmos auditivos.

     O que eu estou querendo dizer não é que o esforço não é uma parte importante da vida, é lógico que é. O que estou querendo dizer é que só recentemente eu tenho começado a entender a diferença entre esforço e sofrimento. Eu sempre soube que para fazer certas coisas ou chegar a certos lugares eu deveria me esforçar, e isso é claro e cristalino, mas nos últimos anos eu tenho sofrido achando que se tratava de esforço e, consequentemente, eu achava que esse sofrimento era necessário, mas não era. E pensando a respeito de tudo isso eu cheguei a algumas conclusões extremamente importantes para mim: 
  1. O que eu achava que queria fazer e onde eu achava que queria chegar tinha 0% a ver com o que eu realmente quero e 100% com o que eu achava que era esperado de mim.
  2. O que é esforço para uma pessoa, pode ultrapassar os meus limites e se tornar sofrimento pra mim, então não existe o menor motivo para eu comparar "as coisas que eu consegui na vida" com as das outras pessoas.
  3. Essa paranoia de me tornar uma pessoa que no futuro possa dizer que “tentou tudo que podia fazer” fez com que minha saúde mental se tornasse um grande pedaço de m*rda.
  4. Essa mesma paranoia se tornou (na real, acho que sempre foi) um escudo e uma desculpa para que eu não lidasse com outras questões renegadas na minha vida, como minha grande dificuldade de socialização. "Desculpa, tenho que terminar projeto" alguém já ouviu essa? Eu juro que não é por mal, nem é mentira, sério mesmo.
  5. Toda vez, repito, TODA VEZ que falo sobre esse assunto com alguém, a pessoa sempre se relaciona em algum nível, seja nas expectativas absurdas, na auto cobrança extrema, ou na negligencia pela saúde mental e pelas relações interpessoais em detrimento do sucesso na vida acadêmica/profissional, e em geral essas pessoas também se sentem infelizes como eu com a forma que estão encarando a vida, e isso não é um prognóstico legal, galera.
  6. Pensar em todas essas coisas e maturá-las em forma de textos, de conversas e de noites sem dormir de modo algum me garantem que eu não vá voltar a esse mesmo modus operandi na minha vida, exatamente porque é algo tão arraigado que eu já não sei bem quais são as outras alternativas. E isso é bem assustador.

      No fim, eu só queria dizer mesmo que não é normal se sentir infeliz, ansioso ou temeroso o tempo todo com a vida que estamos levando, e que não há vergonha nenhuma em admitir esses sentimentos e buscar uma mudança - e talvez com auxílio - por algo mais saudável e que se adapte àqueles que são os nossos quesitos individuais de felicidade, sucesso e realização pessoal.

-Luana Rôla de Sousa

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Precisamos falar de cachos (seja você cacheado ou não)


    Corpo, uma coisa simples que a gente já nasce com. A gente aprende na escola: cabeça, tronco e membros, e em geral é assim mesmo. É algo tão natural que nem parece que algumas pessoas tem que aprender a ACEITAR o próprio corpo - ou certas partes ou aspectos dele. A cor desse corpo, o formato desse corpo, o tamanho, a integridade, as coisinhas que estão grudadas nele.  Para algumas pessoas é muito fácil, pra mim nem sempre foi. E o pior é que ninguém sabe exatamente quem, onde e como começou essa história estúpida de o que é certo, essa coisa de beleza. Só sei que antes mesmo de eu ter cabeça o suficiente pra raciocinar quaisquer umas dessas minhas dúvidas, eu já havia começado a sofrer por não estar dentro de muitos quesitos que sei lá porque foram chamados de “padrão”, e o mais difícil deles - e quem me conhece provavelmente vai pasmar - foi o meu cabelo.

    Eu não sei como que num lugar como o Brasil, em que nascem tantas cacheadas - e cacheados -, ainda se tem uma cultura que rejeita os cachos: ninguém sabe cuidar, ninguém sabe cortar, ninguém sabe o que fazer, e assim, quem sofre são pessoas como eu, que terminam carregando por duas décadas algo na cabeça que elas odeiam, e que não têm como se livrar, simplesmente porque nasceram assim.

    Pode parecer bobagem, mas eu tenho certeza que você não compra simplesmente qualquer roupa para andar pra todo lado, afinal, é a sua imagem, bom, com o cabelo também é questão de imagem, e o poder de escolha sobre ele é bem menor. Eu não conseguiria contar aqui o tanto de vezes que eu quase não saí de casa porque eu sabia que meu cabelo ia ficar armado, com cara de ressecado e todo desarrumado, e eu ia parecer uma palhaça, porque isso iria apenas se juntar à minha pele oleosa e cheia de espinhas, um pacote completo. Então eu recrutava minha tia para fazer tranças que não deixassem meu cabelo mexer um milímetro ou fazia prancha para todos os casamentos e aniversários de 15 anos, mas ainda assim me sentia insegura, e não vamos nem falar sobre o sofrimento durante viagens.


    Resolvi falar tudo isso porque vi essa foto no Facebook, e se essa situação tivesse acontecido com a Luana de 10 anos de idade, ela teria chegado em casa e passado a tarde chorando. Porque eu sabia bem que meu cabelo nunca ia ficar igual ao das meninas que formavam a maior parte da minha sala. E eu tinha toda a noção que meus cabelos mais se pareciam com uma bucha quando eles secavam amarrados no rabo de cavalo que eu era obrigada a usar todos os dias no colégio militar, e eu sabia que nunca poderia usar uma franja igual a todas as outras, por isso eu sei que se eu descobrisse que, além de eu naturalmente não me aceitar, o próprio colégio e a própria “tia” não me aceitavam e reconheciam como meu cabelo “era feio”, eu ia ter ainda mais asco da minha aparência, e ainda menos auto confiança.

    Minha mãe não tinha cabelos cacheados, minhas tias também não, minha avó havia desistido de deixar os cachos crescerem há anos e sempre fazia touca para alisá-los e não lidar com isso, minhas amigas cacheadas fizeram progressiva (e ainda bem que eu vi os resultados ruins, para me fazer desistir dessa ideia), eu não acreditava nas poucas pessoas de cabelo liso que chegavam a dizer “seu cabelo é tão bonito e o meus tão sem graça, nunca alise ele”, e as poucas celebridades que tinham cachos… Bom, eu não podia confiar nelas, elas tinham cabeleireiros 24 horas.

    Mas de uns 3 anos pra cá as coisas mudaram pouco a pouco, eu comecei a ver muito mais pessoas ~na vida real~ assumindo seus cabelos cacheados e conseguindo mantê-los lindos, como realmente são. Eram meninas na minha faculdade, eram blogueiras e youtubers que pareciam ser gente como a gente, e foram exatamente essas meninas que me fizeram desistir da ideia de desistir do meu cabelo. Eu já nem me importava, lambuzava de creme e torcia pra ele não “armar”, e se isso acontecesse, prendia, fim, eu não tinha esperanças que ele ficasse bonito. Mas esse ciclo foi mudando… Eu descobri que cabelos cacheados não devem ser cuidados e cortados da mesma forma que os lisos, e muita gente ignora isso, e descobri que meu cabelo podia ser curto - cabeleireira com olhar de desespero: “tem certeza que quer cortar tanto assim?” -, podia ser longo, podia ser mais claro nas pontas sem parecer a coisa mais ressecada do mundo… Ele podia ser qualquer coisa, mas principalmente: ele podia ser lindo e natural ao mesmo tempo.

   Foi apenas há poucos meses que eu desfiz para mim o mito de que cabelo cacheado precisa ser lavado todos os dias, senão ficava uma farofa, e essa era ainda uma das poucas coisas que me deixavam com o pé atrás com os cachos, e aos poucos eu fui descobrindo que eu não estava “em desvantagem” por não ter cabelo liso, fui aprendendo que Deus não quis me sacanear, colocando só características difíceis de se lidar no meu corpo. Não, eu tenho um cabelo completamente normal, que não precisa ser nem mais nem menos complicado do que qualquer outro.

   Eu não estou aqui para pregar que cabelo só é bonito se for totalmente natural, eu só quero dizer que todo mundo tem o direito de se achar incrível, de ser aceito e de se sentir seguro com o cabelo que quiser, natural ou modificado, tanto faz, mas a gente tem que sair o mais rápido possível dessa caixa que insiste em nos prender em um só tipo de bonito. E é por isso que eu estou aqui falando tudo isso: para pessoas que nem eu, que geralmente só aprendem quando veem o relato do outro, da vida real; e para alguém que talvez esteja lendo isso e ache que é simples demais ser “diferente”, seja lá o que diferente for.

Bisous,
Luana Rôla.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Quem não arrisca não petisca (e quem arrisca também não, às vezes)

(Calma, você vai entender esse print ridículo)

“Quem arrisca não petisca”. É fãcil pra sua mãe (tio, avó…) dizer isso e simplesmente te deixar lá, pra dar todos os passos que precisam ser dados e, ainda assim talvez, não chegar em lugar nenhum. A frase é totalmente verdadeira, entretanto. Ela é o mesmo que o igualmente idoso “você nunca vai saber se não tentar” e o “ninguém ganha na loteria se não apostar”, e eu tenho certeza que devem haver outros que não lembro, mas já deu pra pegar a ideia.
Parece simples, mas pra quem não é acostumado a arriscar, como eu, existem lados perversos da moeda. Vamos para um exemplo extremamente babaca e sem importância para a sociedade atual, mas que me incentivou a pensar sobre o assunto: uma banda da qual eu gosto muito e que me inspira bastante avisou há uns dois meses que lançaria uma espécie de clipe usando uma compilação de vídeos que os próprios fãs mandariam dublando a música. Eu me empolguei de cara, mandei o vídeo, mesmo odiando ter de deixá-lo público no youtube (eu só gosto de alguns segundos dele, o resto revela toda a minha capacidade como atriz: zero, nenhuma, negativa, até, eu diria), mas sei lá, seria tão legal participar de um vídeo dos caras que valeria à pena mesmo se eu aparecesse me mexendo feito um babuíno. Com o tempo, eu passei a ficar mais confiante de que poderia mesmo aparecer, tinham pouquíssimas submissões muito boas, geralmente se a pessoa “atuava” bem, a qualidade da câmera era horrorosa, ou então ela gravava com o celular “em pé” (por favor: SÓ NÃO), e se a qualidade da gravação era boa, a pessoa mal mexia a boca… Eu estava ali, naquela qualidade bem mediana, nem dá vontade de aplaudir, nem de vomitar (pelo menos eu acho, mas prefiro não perguntar).
Mesmo odiando ser gravada, eu arrisquei, e estava praticamente certa de que iria petiscar. Nem precisa dizer que não apareci, né? Eu assisti o vídeo inteiro numa mistura de “cadê eu?” com “porque que os mais interessantes estão em miniaturas e os mais bizarros em destaque?” e depois fiquei me perguntando porque eu tirei as coisas do meu quarto do lugar pra usar a única parede branca que tinha, e depois gastei meu tempo regravando aquele negócio sete vezes e depois ainda paguei o ridículo de acreditar que iam pelo menos se dar ao trabalho de escolher os vídeos mais bem feitos.
Arriscar às vezes cansa, e não petiscar depois de tudo isso, pra muita gente dá um desânimo enorme, e muitas vezes, dá medo de arriscar novamente. E o que eu encontrei nessa história boba da minha vida… Bom, na realidade o que eu não encontrei foi a resposta pra seguinte pergunta: o que pode me motivar a arriscar novamente, se é muito mais fácil eu permanecer nessa zona de conforto na qual eu já passei 80% da minha vida? Sim, eu estou completamente ciente de que a vida tem muito mais surpresas, risadas, histórias interessantes, cicatrizes em formatos engraçados e empregos divertidos e não convencionais quando você está do lado de LÁ da linha do conforto. Mas enquanto eu olho do lado de CÁ da linha e lembro que os 20% da minha vida vividos fora daqui foram meio sofridos e muitas vezes não pareceram valer à pena o trabalho, é muito difícil levantar a bunda dessa cadeira giratória tão agradável.
Eu posso dizer pra mim mesma que o vídeo serviu pra eu perder um pouco do meu desconforto em estar na frente da câmera, e às vezes essas pequenas coisas (pequenas, mas verdadeiras) serão suficientes para que eu me justifique de que o trabalho de arriscar não foi exatamente tempo perdido. Outras vezes não vai adiantar, e eu vou querer achar defeito em tudo que não deu certo pra mim e chamar de sorte tudo que deu certo pros outros (ninguém é legal o tempo todo, desculpa), mas o importante é, depois de tudo, saber que do outro lado da linha NADA é totalmente em vão. (Espera, eu acho que isso é a resposta praquela pergunta!!)
Luana Rôla

E só para provar que eu (supostamente) não guardo rancor algum, aí está o vídeo que ficou bem legal apesar de ter partido meu coração com minha não aparição

sábado, 25 de julho de 2015

Seja lá o que o passado for...

(Foto: Ana Ísis - só para dar uma variada)

A gente aprende desde muito cedo que o passado é tudo aquilo que acontece antes do presente, ou seja, tudo que vai ficando para trás. Mas às vezes nos esquecemos que até esse “A gente” que eu escrevi e que vocês leram no começo desse texto, há pouquíssimos instantes, já está no passado e, de certa forma, já ficou para trás, ainda estejamos pensando nele e lembrando dele agorinha.
Estando longe de casa há quase um ano, eu me acostumei a pensar no passado em termos de “quando eu estava no Brasil…”, mas ontem, de passagem pela primeira cidade para qual eu viajei depois que cheguei aqui, cada canto que eu reconhecia pela janela do ônibus trazia uma nostalgia diferente: da felicidade de quando eu estava dando meus primeiros passos em experiências tão novas, de estar dividindo tudo isso com pessoas tão fascinadas e cheias de dúvidas como eu, de não ter a menor ideia do que aquelas pessoas pensavam de mim, ou se eu teria companhia para as próximas viagens, da dúvida se eu ainda seria muito surpreendida pelos lugares que ainda me esperavam e se eu ainda conheceria muitos lugares, como eu realmente queria.
E então, naquele ônibus tão estupidamente parecido o primeiríssimo ônibus, depois de ter tipo um dia tão alegre, eu me vi cercada por algumas dessas companhias da primeira viagem, algumas novas também estavam ali, e eu ainda dividia acento com a mesma amizade, e foi aí que eu percebi o quão longe no passado estava aquele dia de uns 10 meses atrás, o quão estavam distantes aqueles medos, aquelas expectativas, aquelas emoções, aquelas primeiras vezes, e como tudo deu lugar a novos medos, expectativas e etecétera que me confundem nesse momento.
Muitas vezes é meio doloroso categorizar coisas que a gente amou viver como passado, exatamente porque parece que é algo que “ficou para trás” e é completamente impenetrável, e apesar de que às vezes seja realmente meio inacessível - como estar no mesmo lugar, com as mesmas pessoas, com aquela mesma mentalidade - isso me faz pensar em como eu não imaginava, nem por um segundo, que eu estava construindo para mim um passado tão incomparável exatamente no mesmo segundo que eu vivia cada um dos momentos que, naquele instante, tanto me pareceram “a melhor noite da minha vida”, “a melhor viagem da minha vida” e assim por diante.
Hoje eu vejo uma coleção de melhores momentos, olhando para esses 21 anos. Daqui há um mês ou uma década, eu posso lembrar de mim nesse quarto, com esse computador, de vez em quando olhando de canto pro meu reflexo na janela e achando que nesse segundo eu me pareço mais com uma escritora do que eu jamais vou parecer na vida (sentada encurvada, com os dedos furiosos, o cabelo bagunçado e a chuva caindo), e talvez eu ria, me ache boba e me afogue em mais um tico de nostalgia. Eu só espero que quando eu olhe para trás e tome um susto com tudo aquilo que já se tornou passado, eu possa estar, ainda que com lágimas nos olhos como estou agora, sorrindo de felicidade.

--Luana Rôla de Sousa

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Futuro, Futuro Meu


"Se você, assim como eu, há mais ou menos 10 anos estava em sua fase teen e tinha um milhão de concepções - provavelmente retiradas de filmes e séries - de como seria os seus 20 e poucos anos, faz aqui um favorzinho e pensa comigo: onde você se imaginava estar a essa altura? Fazendo o que e com quem? Agora vamos olhar para as nossas vidas (não, isso não se trata de um texto de auto-ajuda, eu acho!) pra pensar se concluímos pelo menos metade do que achávamos que seria ideal. Se sim, você concluiu, peço que se retire do recinto, você não se encaixa na minha classe padrão de mimimi. Brincadeirinha, fica, por tudo de mais sagrado, e ensina pras amigas aqui o segredo do sucesso. =)
Na realidade, se eu for parar para pensar, se eu estivesse agora onde eu imaginei que estaria aos 21 segundo o diário da Luana de 12, 13 anos de idade, muitas coisas seriam bem mais organizadas, porém muitas outras seriam bem mais chatas, confesso. Talvez eu tivesse sido, como já falei, muito influenciada por uma versão de young adults americanizada vista nos filmes, eu esperava coisas como: estar morando só (o que em tese estou, mas só até o mês que vem), ou talvez dividindo um apê muito legal com minha melhor amiga, estar praticamente formada, com emprego e amando o futuro profissional que me é reservado, ser experiente nos terrenos complexos do coração, e quem sabe estar namorando o cara com quem, dentro de uns 5 anos, eu iria casar, ser super bem resolvida com praticamente tudo, possuir muitos terninhos no armário, ser organizada com as minhas contas, mandar muito bem na cozinha, obrigada, provavelmente ter algum nível de fama, ou pelo menos, ser melhor amiga de alguma celebridade bem legal… E todas essas coisas estão divididas em algumas categorias: 1 - Coisas boas que eu consegui realizar bem mais ou menos (provavelmente só a parte de cozinhar? Hahahaha); 2 - Coisas que eu queria ter conquistado, mas não consegui e ponto; 3 - Coisas que eu não conquistei, mas, de boas, melhor que elas fiquem reservadas para um futuro próximo e 4 - Coisas que “não, muito brigada” (até porque não, não estou disposta a usar terninhos).
E sabe mais o que? Isso não é ruim, não senhor. Se eu não sou tão bem resolvida quanto eu queria ser, pelo menos com certeza sou menos babaca do que eu era 10 anos atrás e sem dúvidas sou mais sem perspectivas hoje do que o que eu vou ser aos 31 - ou assim espero. E só porque eu acabei de ver no facebook o status sobre o noivado de uma menina que estudou na mesma sala que eu no Fundamental e as fotos do casamento civil de uma menina com quem eu cantei as músicas do RBD, não significa que eu queira isso para a minha vida no presente, como há anos eu achava que eu poderia querer.
Se algumas coisas foram retiradas ou indeterminadamente adiadas da minha lista de desejos, outras que me pareciam totalmente impensáveis ou  fora de alcance, como morar fora do Brasil, foram acrescentadas e, melhor, concretizadas. Acho que a melhor coisa que ansiosos e perfeccionistas - como eu, às vezes - podem aprender é que o que importa não é ser perfeito, mas saber lidar com as coisas da melhor forma, e isso foi algo que eu ouvi da boca da Taylor Swift, num show que me foi um sonho persistente, mas que demorou mais de meia década para se concluir.
Assim, dou parabéns e posso dizer que tenho grande admiração a quem chegou até aqui realizando seus sonhos que permaneceram basicamente os mesmos, a quem teve a audácia de de se adaptar aos seus novos desejos e até mesmo a mim, que depois de anos, continuo sonhando com o dia em que a Emma Watson vai se tocar que ela precisa de uma melhor amiga exatamente igual a mim (ou vocês acham  que eu escolhi vir estudar na Inglaterra porque?)."


--Luana Rôla

terça-feira, 9 de junho de 2015

Dear Spring


Querida Primavera,
Escrevo-te pouco depois de você se ter ido, mas espero, de coração, que estas palavras te alcancem. Você chegou quando eu mais precisava, quando o frio já não me era novidade e estava conseguindo me prender em casa, quando a saudade não me cabia no peito, quando eu estava mais cheia de tarefas do que eu me achava capaz de suportar. Seu vento ainda um pouco gelado misturado com os raios de sol, finalmente quentinhos, as cores nas flores, os banhos despropositais nas chuvinhas de fim da tarde, o sol prolongando sua estadia nesse céu cada dia menos cinza, tudo isso foi cenário perfeito pros abraços de reencontros que eu tanto precisava. Você tornou tudo tão lindo. E ainda quando as coisas ficaram pesadas, era esse mesmo cenário colorido que você proporcionou que me ajudavam a levantar e andar todos os dias pra onde eu precisava, porém não queria ir.
Com você eu cantei músicas no meio da rua que falavam sobre a temporada das flores, distribuí sorrisos só porque quis e fiz britânicos pensarem que o manicômio mais próximo tinha perdido uma de suas paciente. Ah, e tirei as melhores fotos mentais desse lugar que amo que espero me lembrar ainda quando os anos quiserem roubar meus tempos dourados da minha mente cansada. É sempre melhor sentir essa nostalgia antecipada em meio às suas flores e ao som de seus passarinhos, até as gaivotas enormes voltaram a marcar presença e fazer companhia, é o cenário perfeito para as minhas memórias, e eu te agradeço por isso.
Você passou bem mais rápido do que eu tive a sagacidade de perceber, saiu tão de mansinho quanto chegou, e deixou uma marca em cada uma das mil partes do seu irmão Verão, tanto que ele tem me lembrado muito de você ainda por enquanto. Porém não se preocupe, sua estampa é ímpar e estará sempre comigo. Pode ter a certeza de que no meu futuro, nas viagens que ainda sonho fazer, buscarei sempre te reencontrar, para encher com seus cheiros, cores e sons minhas melhores lembranças.
Até um futuro que espero vir breve,


domingo, 17 de maio de 2015

Desculpa pelo que?


Essa é uma foto minha totalmente sem maquiagem, mas esse não é um texto sobre maquiagem, ou a falta dela. Quer dizer, não exatamente. Já tem alguns dias que eu vi um vídeo da iiSuperWomanii em que ela fala sobre o dia em que ela se desculpou por ir a uma reunião "looking like a mess", o que eu vou traduzir como "estar destrambelhada " por não me ocorrer outro termo agora. E quando ela olhou pra si mesma, o que ela chamou de destrambelhada era, na realidade,  apenas ela, de moleton, cabelo natural e rosto sem maquiagem, o que é, basicamente, ela! Ela, elazinha, normal, natural. Foi aí que ela disse que notou como não deveria se desculpar por simplesmente parecer consigo mesma.
Então eu comecei a me perguntar quando foi que começou a deixar de ser tão natural a gente estar natural. Acho que pra mim - e pra muitas outras pessoas, especialmente meninas - foi na adolescência, quando a acne começou a surgir com força total e o cabelo virou uma loucura, e tentar ser uma versão melhor de si mesma virou uma luta diária, com bases, pós, mil produtos de cabelos... E nada disso é exatamente ruim, mas eu já me peguei tantas vezes dependendo de tudo isso que, sim, vira um problema. Mas nada disso é novidade, a gente já ouviu um milhão de vezes essa conversa sobre dependência de produtos de beleza para se sentir bem, o que me bateu dessa vez é que, apesar de não ser a situação no vídeo, é uma situação que eu já vivi: os outros esperarem uma imagem "photoshapada" de você. 
Eu faço arquitetura e uma vez ou outra eu já ouvi meus professores pedirem pra gente se maquiar ou usar roupas melhores nas apresentações de projeto, e na ultima vez que ouvi isso, olhei ao redor da sala procurando se tinha alguém vestido de forma não profissional, e não havia, o que havia eram alguns rostos claramente cansados dos milhões de horas investidos nesses trabalhos. É aí que eu vejo que, além de aguentar a pressão que colocamos em nós mesmos de caber em determinados padrões, tem gente alí, do lado de fora, esperando ver nossas versões melhoradas como se isso fosse um pré-requisito natural, como se isso fosse esperado e normal. Não me entenda mal, eu vou continuar me maquiando, vestindo roupas mais arrumadas, fazendo algo diferente no meu cabelo, tudo isso quando eu quiser ou quando convir, o que me incomoda é que eu associe minha aparência de "como vim pro mundo" como destrambelho, como uma bagunça, e o que me incomoda é que as outras pessoas pensem isso de mim também, e que eu pense isso da aparência daqueles ao meu redor. 
Aquela lá em cima sou eu, de pele falha e oleosa, com os cabelos secando ao natural, a mesma Luana da foto do lado, maquiada, no perfil do blog, nenhuma delas está destrambelhada, todas as duas são totalmente aceitáveis, ou pelo menos é isso que eu estou trabalhando para enxergar.